Cantinho da Poesia

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O AMOLA TESOURAS

Toda a gente já sabia
que dentro em pouco chovia,
quando no bairro se ouvia
a flauta do amolador.
Sons agudos e prolongados
arrastados pelo vento,
traziam, num só momento
miúdos alvoroçados
dispondo-se em seu redor.

Vinham as mães, as avós,
uma tesoura, um canivete
antigos, quase amuletos,
gastos de tanto afiar
na pedra de amolar
montada na bicicleta.

O amolador pedalava
a bicicleta parada
e a pedra rodava, rodava
como a mó de um moinho.
A lâmina faiscava
e as faíscas espalhavam
centelhas pelo caminho.

Ah, como eu gostava de ver
as faíscas a saltar
como fogo de artifício.
Não pestanejava sequer
como se estivesse a aprender
os truques daquele ofício.

As varetas retorcidas
de velhos chapéus de chuva
revirados pelo vento,
ficavam como uma luva
direitinhas como novas,
prontas para outras provas,
e outras lutas com o tempo.

E a flauta?
Ai, a flauta era mágica, celestial
aos ouvidos de criança.
Deixava-me deslumbrada
e a comoção era real
nos meus olhos cor de esperança.

Depois do conserto
e do Concerto
e como que por magia
o amolador desaparecia
na esquina da nossa rua.

Ao longe ainda se ouvia
a celestial melodia
na estrada que leva à lua.

Helena Marcão

 

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